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Lei Anticorrupção: pequenos negócios, grandes punições

A obrigatoriedade do compliance anticorrupção para as micros e pequenas empresas (MPEs) não é uma novidade – as normas são de 2013 e 2015 -, porém, há outros fatores que revelam a necessidade do compliance para as MPEs relacionados à sua relevâ

A obrigatoriedade do compliance anticorrupção para as micros e pequenas empresas (MPEs) não é uma novidade – as normas são de 2013 e 2015 -, porém, há outros fatores que revelam a necessidade do compliance para as MPEs relacionados à sua relevância econômica e social e ao número de empresas punidas por descumprimento da Lei Anticorrupção.

Segundo o “empresômetro” da Secretaria Especial das Micros e Pequenas Empresas (acesso em 21.3.2017), em todo o Brasil há aproximadamente 20.904.000 empresas regularmente constituídas, das quais 19.565.000 são micros e pequenas empresas, ou seja, aproximadamente 93,5% das empresas são MPEs. Segundo o Sebrae, até 50% dos empregos formais são por elas gerados.

Com relação ao setor de atuação, o maior impacto pode ser verificado no comércio varejista, onde, segundo a FecomercioSP, aproximadamente 97% são MPEs. Estas são responsáveis por 34,5% da receita do varejo nacional e por 17,8% da receita do atacado. Ainda conforme a mesma entidade, a receita média das empresas no varejo de pequeno porte é de R$ 408 mil por ano e no atacado a receita média é de R$ 1,3 milhão por ano.

Os números revelam a grande importância das MPEs para a economia e para a sociedade, e, portanto, a sua função social, especialmente nos atuais tempos de crise. Apesar da reconhecida importância é comum encontrá-las em situação de real sobrevivência em ambiente que lhes é hostil. Normalmente praticam um modelo de gestão intimamente relacionado ao seu porte, ou seja, de modo geral há um baixo grau de maturidade da administração ou ausência de administração profissional, há alto grau de informalidade nas suas relações, há alto grau de ligação e identificação da pessoa física do proprietário (ou de um sócio) ao negócio, há grande concentração do poder decisório e há escassez de recursos humanos e financeiros, além das conhecidas dificuldades para acesso a linhas de crédito.

Diante desse cenário, poderia parecer que a preocupação com compliance deveria passar longe da realidade das MPEs, que já possuem desafios e dificuldades suficientes. Tal impressão, porém, não é real.

Segundo informações do Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP (acesso em 21.3.2017) há registro de sete empresas punidas por descumprimento da Lei Anticorrupção ou Lei Empresa Limpa. Desse total, seis são MPEs. Em acesso ao mesmo cadastro em 19.10.2016 foi possível verificar um total de 19 punições aplicadas, das quais 15 foram a MPEs. Ainda nesta consulta verifica-se que foram impostas multas a restaurantes, lanchonetes, cafeterias, lojas de bolos e doces, drogarias, entre outras, que totalizam R$1.887.375,96, sendo que há registro da aplicação de multa no valor de R$ 209 mil a uma microempresa e de uma multa de R$ 906.657,65 a uma empresa de pequeno porte.

Ao comparar o número total de MPEs no Brasil ao total das MPEs punidas, o percentual de punições é extremamente baixo. Porém, os números demonstram que as MPEs possuem um altíssimo índice de punições ao considerar o total de punições comunicadas. Também fica patente que algumas multas são extremamente rigorosas em razão do porte das empresas, como se pode verificar dos exemplos citados acima em relação à média de faturamento anual informada pela FecomercioSP.

O número de punições está diretamente ligado ao modelo de gestão praticado e a sua redução pode ser construída a partir da mudança de cultura e da adequação às obrigações legais e regulamentares. Isso não ameniza a infração cometida – que merece reprimenda – e sequer impede o questionamento: as MPEs estão no foco principal da Lei Anticorrupção?

Sabe-se que não são aceitáveis justificativas como “é o jeito brasileiro”, “o risco é baixo”, “é apenas um pequeno negócio”, entre outras e que, em maior ou menor grau, toda empresa possui relacionamento com agentes públicos, fato que justifica a adoção de medidas de compliance anticorrupção.

Compliance, contudo, não está restrito às medidas anticorrupção. Sua abrangência também atinge os relacionamentos privados. Nos relacionamentos com fornecedores, com clientes e com seus colaboradores é possível verificar alto ganho econômico e em eficiência ao implementar controles e procedimentos de conformidade. A implementação desses controles assegura que os produtos ou os insumos utilizados terão origem lícita, confere maior segurança nos contratos, diminui os riscos decorrentes de medidas judiciais, possibilita maior controle de perdas e previne despesas desnecessárias. Todos esses pontos convergem para um processo de consolidação da marca e dos seus produtos ou serviços assegurando melhor posicionamento no mercado. São medidas que beneficiam qualquer negócio, inclusive as MPEs.

Uma MPE somente cumpre a sua função social, e, portanto, torna efetivo o seu papel econômico e social ao desenvolver as suas atividades de modo regular, atendendo as determinações normativas. Acrescentar a essa obrigação as medidas de compliance não é uma real oneração, mas, sim, um meio de viabilizar e perpetuar a atividade para que ela otimize o cumprimento da sua função social e não se torne mais um tão importante pequeno negócio alvo de uma grande punição.

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